terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Fim do Mundo em 2012










Micayon e Naronda
Mantêm uma Palestra Noturna
com Mirdad e Este
os Avisa do Dilúvio
que Está por Vir,
Rogando-lhes que Estejam Prontos.
 
                                     


 
 
Naronda:
                Cerca da segunda hora do terceiro quarto senti que se abria a porta da minha cela e ouvi Micayon a sussurrar para mim:
                "Estás acordado, Naronda?"
                "O sono não visitou minha cela esta noite, Micayon."
                "Nem nas minhas pálpebras fez o seu ninho. E ele - achas que ele - dorme?"
                "Falas do Mestre?"
                "Já o chamas de mestre? Permita o Fado que o seja. Não poderei achar descanso enquanto não me certificar de sua identidade. Vamos procurá-lo imediatamente."
                E andando nas pontas dos pés saímos de minha cela e entramos na do Mestre. Uma réstea de luar prateado, entrando por uma fresta no alto da parede, iluminava o seu humilde leito, estendido no solo. Evidentemente não fora ocupado naquela noite. Aquele a quem procurávamos não se encontrava ali onde o buscáramos.
                Confusos, envergonhados e desapontados, estávamos para volver sobre os nossos passos, quando, subitamente, sua voz amena nos chegou aos ouvidos, antes que nossos olhos pudessem lobrigar sua graciosa figura à porta.
 
MIRDAD:
                Não vos conturbeis. Sentai-vos em paz. No cume das montanhas a noite rapidamente se dissolve em alvorada. A hora é propícia para a dissolução.
 
Micayon: (Perplexo e balbuciante)
                Perdoai-nos se somos importunos. Não dormimos a noite toda.
 
MIRDAD:
                O sono é um auto-esquecimento muito breve. Melhor é afogar a personalidade desperto do que tomar alguns goles de esquecimento em dedais de sono. Que buscáveis de Mirdad?
 
Micayon:
                Vínhamos para saber, quem sois.
 
MIRDAD:
                Entre os homens sou um deus. Quando estou em Deus sou um homem. Compreendeste Micayon?
 
Micayon:
                Dizeis uma blasfêmia.
 
MIRDAD:
                Contra o Deus de Micayon... talvez. Contra o Deus de Mirdad, jamais.
 
Micayon:
                Haverá tantos deuses como há homens para que faleis de um para Micayon e outro para Mirdad.
 
MIRDAD:
                Deus não é "muitos". Deus é único. São, porém, muitas e diversas as sombras dos homens. Enquanto os homens projetarem sombras na terra o deus de cada homem não será maior que sua sombra. Só o que não tem sombra está na luz. Só o que não tem sombra conhece o Deus único. Porque Deus é Luz, e só a Luz pode conhecer a Luz.
 
Micayon:
                Não nos faleis em enigmas. Ainda é muito fraca a nossa compreensão.
 
MIRDAD:
                Tudo é enigma para o homem que segue uma sombra, pois esse tal caminha em luz emprestada e tropeça na sua própria sombra. Quando vos tornardes flamejantes de Compreensão, já não mais projetareis sombra.
                No entanto, em breve virá a hora em que Mirdad apanhará as vossas sombras e as queimará no sol. Então aquilo que para vós é agora um enigma se iluminará em vós como uma verdade fulgurante, demasiado evidente para que necessite de explicação.
 
Micayon:
                Não nos direis quem sois? Se soubermos o vosso nome - o vosso verdadeiro nome -, vossa pátria e vossos antepassados, talvez possamos melhor compreender-vos.
 
MIRDAD:
                Oh, Micayon! É como forçar uma águia a entrar no ovo em que foi chocada o tentar acorrentar Mirdad com as vossas cadeias e vendá-lo com os vossos véus. Qual o nome que se pode dar a um homem que não está mais "na casca"? Que pátria pode conter um homem no qual o universo está nele contido? A que antepassados se pode referir um homem cujo único ancestral é Deus? Para bem me conhecerdes, Micayon, é preciso que antes conheças bem a Micayon.
 
Micayon:
                Talvez sejais um mito vestido com a aparência de um homem.
 
MIRDAD:
                Sim, algum dia dirão que Mirdad era nada mais que um mito. Mas dentro em pouco sabereis quão real é este mito - muito mais real do que qualquer realidade dos homens. o mundo agora não toma conhecimento de Mirdad. Mirdad está constantemente atento ao mundo. Em breve o mundo tomará conhecimento de Mirdad.
 
Micayon:
                Sois, por acaso, o Clandestino?
 
MIRDAD:
                Sou clandestino em toda arca que enfrenta o dilúvio da ilusão. Tomo nas minhas mãos o leme todas as vezes que o capitão pede o meu auxílio. Vossos corações, embora o não saibais, chamaram há muito tempo por mim, em alta voz. Eis-me aqui! Mirdad aqui está para guiar-vos em segurança, para que vós, por vossa vez, possais guiar o mundo para fora do maior dilúvio de que jamais se teve notícia.
 
Micayon:
                Outro dilúvio?
 
MIRDAD:
                Não para destruir a Terra, mas para trazer o Céu à Terra. Não para destruir o Homem, mas para descobrir Deus no Homem.
 
Micayon:
                O arco-íris surgiu no céu há poucos dias. Como falais de outro dilúvio?!
 
MIRDAD:
                Mais devastador do que o dilúvio de Noé será o dilúvio que já está assolando a Terra.
                Uma terra coberta de água é uma terra prenhe de promessa de Primavera. Não assim uma terra que está sendo cozida na febre de seu próprio sangue.
 
Micayon:
                Devemos então esperar pelo fim? Foi-nos dito que a vinda do Clandestino seria o sinal do fim.
 
MIRDAD:
                Não temais pela Terra. Ela é muito jovem e os seus seios transbordam. Mais gerações do que podeis contar ainda serão por ela amamentadas.
                Nem estejais ansiosos pelo Homem, o senhor da Terra, pois ele é indestrutível.
                Sim, inextinguível é o Homem. Inexaurível é o Homem. Entrará para a forja um homem e de lá sairá um deus.
                Mantende-vos firmes. Aprestai-vos. Mantende sob controle vossos olhos, vossos ouvidos e vossas línguas, de modo que vossos corações possam experimentar a fome santa que, uma vez aplacada, vos deixará saciados por toda a eternidade.
                E precisais estar saciados para dardes de comer aos famintos. Precisais estar fortes e firmes para amparardes os que vacilam e estão fracos. Precisais estar preparados para a tempestade para poderdes abrigar todos os peregrinos acossados pela tempestade. Precisais estar sempre luminosos para poderdes guiar aqueles que caminham nas trevas.
                Os fracos são uma carga pesada para os fracos. Mas para os fortes são um agradável encargo. Procurai os fracos; a sua fraqueza é vossa força.
                Os famintos são somente fome para o famintos. Mas para os saciados eles são uma benvinda descarga. Procurai os famintos; a vossa saciedade é a necessidade deles. Os cegos são uma pedra de tropeço para os cegos. São, porém, marcos miliários para os que enxergam. Procurai os cegos; as suas trevas são a vossa luz.
 
Naronda:
                Neste ponto soou a trombeta chamado para a oração da manhã.
 
MIRDAD:
                Namora faz soar mais um dia a sua trombeta, mais um milagre para vós bocejardes entre o deitar e o levantar; para encherdes os vossos estômagos e os esvaziardes, para lascardes as vossas línguas com palavras vãs, para fazerdes muitas coisas que seria melhor não fossem feitas e não fazerdes muitas que precisam ser feitas.
 
Micayon:
                Não devemos ir à oração, pois?
 
MIRDAD:
                Ide! Orai conforme vos tem sido ensinado a orar. Orai de qualquer forma - por qualquer coisa. Ide! Fazei tudo que vos tem sido ordenado fazer, até ficardes auto-ensinados e auto-dirigidos, até haverdes aprendido a fazer cada palavra uma oração e de cada ação uma oblata. Ide em paz. Mirdad tem que providenciar para que a vossa refeição matinal seja abundante e doce.




Mikhail Maimy




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